2009-03-09

talvez vá para casa esta noite

de passagem por um lugar alguém que conhecia mas não me recordo o nome tinha deixado uma cama ali para que revezasse as dores nas costas com as da alma porque estava ali por solidão. por solidão de tanta gente. soube de imediato que os acontecimentos se converteram num discurso repetido e oco como uma fotografia abatida pelo tempo desapaixonado e morno. de tempos a tempos respirava medo da solenidade da morte anunciada. questiono a possibilidade de costurar as recordações numa cicatriz de meio palmo. Num novo impulso ainda no meio de manobras de animação (porque não se repete o simples facto de animar os homens) senti atrás de mim passos ocos. tinha uma sequência vulgar de quem toma conta do espírito da filha morta. passou tempo. não percebi quem me ensinara ou de que forma até então não me lembrava de ter visto lágrimas dentro de água. atravessei de uma margem á outra. e ainda acredito que no clube da virtude da vida se constroem arquitecturas de pontes num só fôlego. aplaudi a vida inteira. a agitação de mim perturba o repouso das três memórias. elevei-me com um sorriso largo padecido sem pressas. testemunhei o estômago vazio não a alma. talvez por apreciar a alucinação da bebedeira de boa índole com que vejo a minha varanda que mais não é do que uma ressaca esfarrapada da possibilidade de ser vi que um homem que não quer ser salvo curva-se de aflições perante as suas melhores memórias. agrada-me o silêncio do mar revoltoso e do fio que a manta protege e da madeira que acolhe e da areia entranhada nos dedos finos e do corpo profundamente livre e das histórias dos sonhos que a lua testemunha numa narrativa riscada de sentidos. que sentem. nunca gostei de régua e esquadro. talvez vá para casa esta noite e acabe por ficar lá a tornar possível.

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